A mais difícil missão de um brasileiro é dirigir, nos momentos atuais, um elogio àqueles que compõem o legislativo federal deste país, sendo tantos e tamanhos os erros praticados, exercidos tanto na conduta própria, amoral, quanto na única função que efetivamente lhe cabe: legislar. Outro fator que não nos soa como novidade é que uma reforma tributária, em ano de eleição, é pura ilusão. Deveremos conviver, mais uma vez, com uma legislação arcaica, retrógrada, da mais alta complexidade. A reforma tributária no Brasil tornou-se sonho impossível. Qualquer projeto de reforma tributária transita pela linha inequívoca do ceder. Não existe reforma sem o desistir. Convenhamos. Tornou-se impossível atender aos desejos e anseios de cada esfera de governo: a federal, a estadual e a municipal, possuidoras de interesses diametralmente opostos: a manutenção ou o crescimento dos volumes arrecadados. Se de um lado operam tais participantes, certos e justos quanto aos seus interesses, no outro campo ou lado desta corda sobrevivem os contribuintes, já exaustos de tanto puxar, em vão. Como que de hábito, ao lado mais fraco deste encontro em batalha caberá o ônus da mudança pretendida. A incapacidade de incutir à mente destes governantes a necessidade de transformar este processo, na desobstrução de um sistema caro, nada funcional, verdadeiro labirinto tributário, submete o Brasil a derivar-se, mais uma vez, de seu leito, de seu bom curso estimado para o novo ano, o que não nos pode, definitivamente, ocorrer. Se mais um ano se passa sem a apresentação de uma verdadeira proposta que possibilite a construção de um país mais justo e equilibrado, se outro novo ano se apresenta sem que assim se proceda — pois a única pauta será a eleição de outubro —, contentemo-nos com atitudes isoladas que, em si, muito pouco representam. Mas é o pouco, é o gole d’água na tarde de verão, que poderá ensejar outros a assim promover. Refiro-me a louvável atitude do deputado federal Arnaldo Faria de Sá, que por iniciativa do competente Sescon, apresentou, em 28 de outubro de 2009, projeto de lei que corrige intensa defasagem existente pela aplicação de legislação tributária em vigor: a Lei 9.249, de 26 de dezembro de 1995. Como que de forma despercebida, versa o parágrafo 1º do artigo 3º da citada lei, que “a parcela do lucro real, presumido ou arbitrado, que exceder o valor resultante da multiplicação de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) pelo número de meses do respectivo período de apuração, sujeita-se a incidência de adicional de imposto de renda à alíquota de dez por cento”. Para o leigo, entenda-se que a alíquota do Imposto de Renda das pessoas jurídicas, aplicado sobre a base de cálculo derivada da apuração pelo regime do lucro real não é 25% e sim 15% a título de Imposto de Renda federal, mais 10% adicionais sobre a parcela que exceder a R$ 20 mil por mês. Afora o mérito de não querermos tratar aqui da precípua necessidade em simplificar um processo tributário que nos toma 36% do PIB, mais aproximados 6% em obrigações outras e acessórias decorrentes de um sistema sem razão, tão melhor seria a aplicação de uma alíquota clara e única sobre a base de cálculo do tributo, que não requeira a compreensão do acima exposto em lei — que se traduzisse numa equivalente alíquota sem cálculos fantásticos e confusos, procura o projeto de lei corrigir a defasagem do valor ali atribuído de R$ 20 mil, ignorante à perda do poder aquisitivo da moeda incorrida neste período de, práticos, 15 anos. Exatamente aqui quer agir o projeto daquele deputado que pretende atualizar a “isenção” de R$ 20 mil para R$ 43,7 mil por mês/período, face a inflação do período segundo o IPCA. Ainda que o efeito da mudança resulte pequeno, será bem vindo, pois tão melhor a retenção da diferença sob as mãos da iniciativa privada que destinada ao sabor dos nobres governantes. Refletindo o efeito sobre uma empresa que apurou resultado positivo — lucro real — de R$1 milhão no trimestre, teremos: Lei 9.249/95 (regras atuais) Projeto de Lei: Economia de R$ 7.110,00 (R$ 94.000,00 menos R$ 86.890,00) (¹) Inexiste no projeto, qualquer proposta para alteração/modificação da alíquota; Diante da não correção de valor fixado em 1995 — quiçá agora restabelecido seu valor —, pergunta-se qual teria sido o volume de arrecadação gerado pelo emprego de um valor para o qual não se viu qualquer correção ao longo destes anos? De certo, ao longo deste mesmo período, de cada um destes anos, não deixaram os tributos de sofrer correções em suas bases ou alíquotas, num claro descompasso e desrespeito no agir. Aproveitando o ensejo do assunto, outros absurdos de mesma natureza: falta de correção de valores determinados em reais nas respectivas legislações, num claro menosprezo à inteligência e reconhecimento de um processo inflacionário de alto impacto que acarreta maior encargo tributário. Permitam-me lembrar que o Decreto 3.000, de 26 de Março de 1999, tão mais conhecido como Regulamento do Imposto de Renda (RIR), em seu artigo 301, dita: “O custo de aquisição de bens do ativo permanente não poderá ser deduzido como despesa operacional, salvo se o bem adquirido tiver valor unitário não superior a trezentos e vinte e seis reais e sessenta e um centavos, ou prazo de vida útil que não ultrapasse um ano”. Como se percebe, reiterando, fixou a legislação fiscal duas básicas situações para provocarmos um lançamento no ativo imobilizado ou em despesa: valor ou custo do bem adquirido e seu prazo estimado de vida útil. Embora a segunda situação — prazo de vida útil superior a um ano — não seja objeto deste comentário neste momento, poderia ser forte argumento para uma discussão bem mais acalorada e técnica, vez que encontramo-nos sob o efeito de nova legislação societária (Lei 11.638/07), que busca proporcionar aderência e sintonia da prática contábil brasileira às normas internacionais de contabilidade, e de novas disposições emanadas pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (Pronunciamento Técnico nº 27), torna incompleto e inócuo o conteúdo da legislação fiscal que submete um ativo imobilizado, pura e simplesmente, à percepção destes dois únicos fundamentos: vida útil e valor. Quanto ao valor, cumpre-me atentar que a fixação do valor de R$ 326,62 data de 31 de dezembro de 1995, surgido ou derivado da multiplicação de 394,13 Ufirs (Unidade Fiscal de Referência extinta face o §3º do Art. 29 da Medida Provisória 2095-7 de 2000) pelo valor desta, em reais, em 1º de Janeiro de 1996, de R$ 0,8287, sem quaisquer correções desde então. Em síntese, os gastos na aquisição de um móvel de escritório qualquer pelo valor de R$ 300,00 em 1995, classificados contabilmente à época, como despesa operacional face a permissibilidade/valor da norma, será o mesmo bem se considerada uma inflação (IPCA) de mais de 141,63% (de janeiro de 1996 a dezembro de 2009) adquirido hoje por R$724,89, classificado contabilmente como ativo imobilizado, face a exigência da mesma norma fiscal. Mesmo bem, tratamento distintos. Decorridos 14 anos completos de outra e tamanha injustiça tributária, tão ou mais onerosa que a primeira, o valor de R$ 326,62, corroído e defasado pela sua não atualização, submete e impede, pelo comando legal, os contribuintes de descarregarem tais gastos como despesa — que diminui o lucro tributável. Os contribuintes vêem-se obrigados a registrar tais gastos como ativos imobilizados. Clamamos pela correção deste e de todos os outros valores que, da mesma forma, encontram-se fixados em determinado valor, numa clara afronta aos direitos constitucionais, num claro comprometimento da capacidade econômica e abuso do poder de tributar do Estado brasileiro.
Base tributável: R$ 1.000.000,00
(¹) IR alíquota de 15% = R$ 150.000,00
(²) Adicional do IR de 10% = R$ 94.000,00
Base tributável: R$ 1.000.000,00
(¹) IR alíquota de 15% = R$ 150.000,00
(³) Adicional do IR de 10% = R$ 86.890,00
(²) Regras atuais/cálculo: ((R$ 1.000.000,00 menos R$ 60.000,00) vezes 10%);
(³) Projeto de Lei/cálculo: ((R$ 1.000.000,00 menos R$ 131.100,00) vezes 10%.